sexta-feira, 2 de abril de 2010

MALHANDO OS "JUDAS"

Dia 02 de abril de 2010. Sexta feira santa ou da Paixão de Cristo. O dia hoje amanheceu cinzento em Brasília, com cara de “sexta feira santa” mesmo. Assim se costuma dizer quando um dia está calmo demais, com nuvens de chuva encobrindo o azul do céu, bem carregadas. Mas hoje, é mesmo o dia considerado santo, feriado, tudo fechado, os fiéis religiosos revivendo a via Sacra de Cristo, rezando, pedindo proteção, pagando promessas e crendo que, com muita fé, Deus e seu Filho irão olhar por nós, pobres pecadores nesta Terra. Um dia, sobretudo, de muita meditação e para quem quiser acreditar em extraordinários milagres divinos.
Esta sexta ficou mais calma ainda, para quem ficou, não foi a lugar nenhum, nem viajou, nem foi ao cinema ou almoçar numa praça de alimentação de shopping. Quem viajou, movimentou-se, aproveitou deste modo o feriado. Quem ficou em casa, aproveitou de outra forma, colocando em dia alguma coisa doméstica, batendo papo com a família e amigos ou até mesmo dormindo, quando não optou por ouvir música ou ver televisão.
Acontece que amanhã, sábado – o sábado de Aleluia, é como se as pessoas, especialmente aqueles religiosos citados, acordassem para a ressurreição da própria vida. Claro que tem muita gente que nem se toca com isso. Afinal, nesses tempos modernos, em que tanta coisa, tantos valores anteriores caíram por terra, um feriado, por esta ou aquela data, é apenas mais um feriadão e oportunidade para um bom descanso e diversão. E aqui, nada contra aos que procedem assim. Não significa que pessoas que se divertem, não tenham também suas crenças particulares ou mesmo as populares.
Ocorre que este texto não quer questionar nada disso. Obviamente, surgiu por algo, por algum fato. E, na calmaria desta santa sexta feira, surgiram lembranças de tradições cultuadas especialmente no sábado de Aleluia. A “Malhação do Judas”, o traidor de Cristo. Espanhóis e portugueses trouxeram para a América do Sul essa tradição. Daí, nas cidades brasileiras criou-se o costume da confecção de bonecos de pano, no tamanho de um homem, que representavam o Judas traidor. Só que, logo em seguida, o povo aproveitou para colocar nesses bonecos os nomes de pessoas que não estavam muito no agrado popular. Políticos, governantes, comerciantes ou até algum vizinho da região, do bairro, que tivesse causado algum transtorno geral nos meses anteriores.
A malhação do Judas sempre foi uma coisa divertida nas manhãs do sábado de Aleluia. Os bonecos amanheciam pendurados nos postes das ruas e por volta das 10 da manhã, as pessoas caiam literalmente de pau neles, numa espécie de libertação de seus recalques ou aborrecimentos contra aquela figura certamente não muito popular. E com isso, muitas vezes, a própria figura do Judas Iscariotes acabava no esquecimento.
Todavia, o tempo passou e com isso, principalmente nas grandes cidades, o ato de malhar o Judas foi se dissolvendo. Provavelmente, a maioria das crianças nascidas agora, nunca irão se divertir com essa manifestação que agradava a muitos e com certeza desagradava aos “malhados”. Aliás, malhado hoje tem outro sentido. São os que malham nas academias de ginástica e por fim acabam sarados.
Pensando bem, muita coisa aconteceu para o quase fim e esquecimento dessa tradição popular, que hoje não vemos ou ouvimos falar muito como antes. As cidades cresceram quase que incontrolavelmente. E mesmo assim, com os inúmeros postes de rua decorrentes do seu crescimento, com certeza faltariam esses para se dependurar a quantidade incontável de “Judas” atuais, os traíras dos tempos modernos, que proliferaram aos milhares, como se uma epidemia de mau caráter tivesse se espalhado geral.
Então, com a ausência dos bonecos de pano pelos postes, os jovens de hoje ficaram privados deste prazer particular, de pelo menos uma vez ao ano, terem a satisfação de assistir ou mesmo participar do festival de cacetadas nas figuras de certos traidores do meio social.
Contudo, apesar do quase final da era dos Judas pendurados em postes, ainda resta um ponta de esperança para que essa “malhação” não seja cada vez mais uma coisa de academias do culto ao corpo. Isto vai depender, mais uma vez, do processo educativo das populações, que seja realizado em alto nível, com a colocação de muita “luz” na cabeça das pessoas. Somente assim, malhar os diversos Judas será possível com um ato de inteligência e não troglodita como era feito até então. Vamos então aguardar a chegada de alguém que não tema a disseminação verdadeira da educação e da cultura no seio da massa populacional. A transferência de conhecimentos é igual à transfusão de sangue. Quanto mais se doa sangue, mais o sangue aumenta no corpo do cidadão. Com a educação não é diferente, mas ainda assusta a alguns, especialmente candidatos a Judas por aí afora, traidores que a seu modo irão dar em nós, a rasteira certa no momento oportuno.
Enquanto isto não acontece de verdade, vamos aguardar, pois, domingo será mais uma comemoração da Páscoa. E esta simboliza a renovação da própria vida. Quem sabe este domingo, dia 04 de abril, não marque o início de uma verdadeira renovação. Milagres podem acontecer. Nunca é demais manter a esperança, já que “água mole em pedra dura, tanto bate até que fura”. Este ano é um ano importante para nós, brasileiros. Devemos renovar muita coisa por aí. Por isso, Feliz Páscoa e felizes escolhas daqui por diante, com “malhações” inteligentes, “doa a quem doer”. E essa foi um plágio evidente.